Brasil , 2007 - 112
Comédia
Heitor Dhalia
Roteiro:
Marçal Aquino e Heitor Dhalia
Elenco:
Selton Mello, Silvia Lourenço, Paula Brown, Leonardo Medeiros, Flávio Bauraqui, Alice Braga, Milhem Cortaz, Martha Meola, Dionísio Neto, Lorena Lobato, Lourenço Mutarelli, Susana Alves
“De todas as coisas que eu
tive, as que mais me valeram, dais que mais sinto falta, são as coisas que não
se pode tocar. São as coisas que não estão ao alcance de nossas mãos. São as
coisas que não fazem parte do mundo da matéria”.
Sempre fui bastante patriota com relação a filmes. Enquanto grande
parte das pessoas prefere gastar dúzias de reais para assistir no cinema mais
um lançamento hollywoodiano, eu me contento com um bom filme nacional.
Especialmente se o mesmo for uma adaptação de uma obra, valorizando ainda mais
a literatura brasileira.
Muitos alegam que os longas da nossa terra tupiniquim abordam
sempre os mesmos assuntos: sexo, favela e sertão. Poucos percebem que o importante,
na verdade, não é o gênero com que se trabalha, mas sim o conteúdo que tal
gênero carrega. O Cheiro do Ralo é um
dos exemplos que servem para distorcer esta imagem preconceituosa.
Baseado na obra de Lourenço Mutarelli e dirigido por Heitor
Dhalia, a produção é de 2007 e ainda assim, infelizmente, pouco notada. O
protagonista é Lourenço, interpretado brilhantemente por Selton Mello, que se apaixona por uma bunda. Ele trabalha em uma
loja na qual as pessoas vão para vender objetos usados. No banheiro do seu
escritório, o ralo entope e começa a feder, daí o título do filme.
O cheiro é tão forte e penetrante, que Lourenço passa a colocar a
culpa de suas atitudes (em sua grande maioria, gritantes) no ralo. Esse pequeno
objeto por onde os coliformes fecais se aglomeram passa a ser a fonte de
energia e força de Lourenço em todas as suas loucuras. Chega a ser filosófico,
inclusive, quando ele diz: "Esse
ralo é um portal para o inferno".
Apesar de ser nítido o egocentrismo e a prepotência do personagem,
na sua falta de compaixão com os clientes e na sua perspectiva de acreditar que
todos têm seu preço, há a metáfora do vazio existente em sua vida, preenchido
pelos objetos inanimados ao seu redor. E também há romance, ainda que de forma
não tradicional: Lourenço e a bunda. A bunda de uma garçonete que ele conhece
no horário do almoço. O fato de comprar coisas dos outros faz com que ele tenha
uma ânsia de possuir a bunda para si. É uma comédia dramática, com um desfecho
impactante, que reflete o cotidiano de um homem desprezível e, no final das
contas, emotivo e falho como qualquer outro.
O Cheiro do Ralo é mais uma
ótima película brasileira, provando que o espírito patriótico não deve se
resumir apenas ao futebol. Já há ralos demais no país para que o nacionalismo
seja jogado definitivamente no esgoto.
"Meu pai Frankenstein. Ele só saiu com a minha mãe uma vez.
Eu nem sei seu nome. Ele nunca me viu, nunca soube o quanto o amei. Ele foi, eu
fiquei. Ele é mais triste que eu, porque talvez ele não tenha ninguém, e eu
tenho ele. Meu pai Frankenstein".